Por que ter um Dia do Homem?

15/07/2011

Nas andanças pela internet, descobri pelo blog do Leonardo Sakamoto que dia 15 de julho é Dia do Homem no Brasil. Assim como ele, não tinha a mínima ideia disso. Sei que existe um movimento por um Dia Internacional do Homem, reconhecido pela Unesco, mas com a data de 19 de novembro. Não sei por que o dia brasileiro é diferente. A pergunta óbvia a se fazer é: por que ter um dia do homem? De acordo com o que diz a Wikipedia sobre o dia internacional, ele serve para se focar em questões de saúde masculina, promover igualdade de gêneros e destacar modelos masculinos positivos, além de “combater o preconceito ao homem e celebrar seus feitos e contribuições, em particular contribuições para a comunidade, família, casamento e cuidados infantis”. São pontos para se discutir, mas não sei se ajuda muito. Ainda não explica por que se criar um dia desses. Vou discutir a questão, com a ajuda da Wiki para organizar os argumentos, e tentar expor por que eu acho que é uma data que deve sim ser comemorada.

Impossível não associar ao Dia da Mulher, 8 de março, que começou na antiga União Soviética em 1913. É fácil ver por que ele existe. Desde muito tempo vivemos numa sociedade patriarcal, em que as mulheres foram relegadas a funções e papéis subalternos. Durante todo o século 20, elas lutaram por igualdade, e em alguns lugares avançaram bastante, mesmo que ainda não a tenham alcançado plenamente. Vale para todo grupo oprimido: datas comemorativas ajudam a aumentar a consciência para o problema e a visibilidade do grupo. Mulheres, negros, índios, LGBTs e outros, todos têm datas para comemorar suas lutas. Datas inevitavelmente deturpadas para virarem alguma outra coisa, mais festiva e menos reflexiva, mas enfim.

Inevitável perguntar: mas se o homem não sofre opressão de ninguém, pra quê? É fácil confundir com outras iniciativas, tipo o tal “dia do orgulho heterossexual” que foi discutido não muito tempo atrás. Sofrem pela falta de bom senso. Quando um grupo oprimido quer visibilidade, é parte da luta; quando um grupo não-oprimido faz a mesma coisa, só esfrega na cara o fato de que não é oprimido, a ainda tem um gostinho de arrogância preconceituosa. A Lola explica isso muito bem, vão lá pro post que fala disso no blog dela.

Então, de novo: pra quê? Não é a mesma situação? Ou vai dizer que o homem sofre opressão? Pois sofre. O homem (ainda, infelizmente) é dominante na sociedade, mas não ser dominado não é a mesma coisa que não sofrer opressão. A diferença é que ela não vem de um grupo acima na pirâmide de poder, mas de toda a sociedade, inclusive (e talvez principalmente) do próprio homem.

A relação homem-mulher é diferente de qualquer outra do tipo dominador-oprimido (como brancos-negros/índios, ou héteros-LGBTs, por exemplo). Não tenho aporte teórico para fazer um estudo aprofundado dessas questões, então isso é “só” discussão da realidade, e não tese acadêmica, mas vamos lá. Primeiro, homens e mulheres são de fato seres diferentes, seus corpos são diferentes, muito além de detalhes como cor de pele; têm diferentes papéis reprodutivos. Segundo, você pode imaginar uma sociedade com uma só etnia, religião, comportamento sexual (não confundir com orientação sexual). Mas não existe sociedade só de homens ou só de mulheres. Se há uma divisão da qual não pode se escapar, é essa. Esses fatores deixam essa divisão muito mais complexa que qualquer outra. Não há apenas dominador-dominada, há todo um espectro de percepções, papéis e funções de gênero que definem nossa percepção de homens e mulheres.

Durante o processo de emancipação feminina, as mulheres discutiram tudo isso em relação a elas: qual o papel da mulher na sociedade? o que é ser mulher? o que é ser feminina? quais os preconceitos que a mulher sofre? Já os homens, do alto do trono, no máximo cederam poder. Nunca se submeteram aos mesmos questionamentos. O pouco que mudou do papel masculino foi mais por inércia, com a mudança do mundo pelo feminismo, do que por autorreflexão. É aí que um Dia do Homem têm importância fundamental: fazer acontecer todo esse debate.

O homem também tem que se libertar de seus papéis, impostos em boa parte por si mesmo para um mundo que felizmente não existe mais. Assim como a mulher, o homem precisa se emancipar do patriarcado. A dominância não faz com que seu papel de gênero seja menos alienante ou empobrecedor, ou que ele não seja vítima de inúmeros preconceitos. Além disso, por ser visto como dominante, muitas vezes recebe menos atenção quando é vítima, seja de mulheres ou de outros homens. Ao contrário do que possa parecer, um Dia do Homem não precisa ter nada de antifeminista ou de exaltação do patriarcado, muito pelo contrário.

Existe uma lista enorme de questões a se discutir para uma libertação do homem de seus papéis de gênero, e para a luta por direitos iguais e contra o preconceito:

  • maior conscientização quanto a problemas de saúde: o homem tende a achar que é invencível e não se preocupar tanto com a saúde, menos ainda com problemas particularmente masculinos. Fora o “ninguém vai meter dedo no meu cu, não!”
  • ainda em saúde: há sociedades em que o clitóris de meninas é retirado por razões religiosas, e isso atrai comoção quase universal. Em compensação, a circuncisão, que também é mutilação genital, é considerada nada de mais. No mínimo, respeitada como ritual judeu (aí pode), no máximo usada nos EUA em quase todos os recém-nascidos como “política de higiene”.
  • educação: meninos ainda aprendem que precisam ser fortes, não podem demonstrar fraqueza, não podem ser vítimas, sempre vitimadores. Além das consequências óbvias, como incentivar a agressividade, há outras menos perceptíveis: por exemplo, é muito mais provável que meninos não denunciem quando são vítimas de abuso sexual.
  • Aliás, falando em abuso sexual, é um foco de preconceitos. O crime é sempre diminuído quando a vítima é homem, seja o estuprador homem ou mulher. Aliás, há lugares onde o crime de estupro sequer considera a vítima masculina. Também há quem ache que é impossível um homem ser estuprado por uma mulher. Além disso, considere o caso das prisões: todo mundo sabe que o estupro corre solto, mas não há nenhuma medida contra isso, só piadas. Imagine se as prisões fossem mistas e as vítimas,  mulheres: será que a reação seria a mesma?
  • Um assunto correlato é a violência doméstica. Muita gente sequer considera que um homem pode sofrer violência doméstica. Mesmo que seja mais rara que a violência contra a mulher, ela existe. A nossa própria (ótima) Lei Maria da Penha é geralmente tratada como uma lei para proteger apenas as mulheres, quando deveria ser considerada uma proteção a qualquer vítima de violência doméstica. Imagine como fica uma vítima masculina? Que coragem, que incentivo tem ela de fazer uma denúncia? Que esperança tem de que a justiça seja feita? Mais fácil imaginar até o juiz rindo da cara do coitado.
  • Voltando às prisões: quase toda a população carcerária é de homens. Quantos estudos há sobre isso, que ajudem a determinar a causa? Quantas políticas há para combater essas causas?
  • Direito familiar: foi aqui que muito do movimento pelos direitos dos homens surgiu. Há uma tendência de que questões como guarda dos filhos, pensões alimentícias, visitas, sejam julgadas em desfavor do pai.
  • Pais também têm direito a quase nenhum tempo de licença-paternidade.
  • Na cabeça de muitas pessoas, ainda é responsabilidade e dever do homem prover para sua família.
  • Homens são teoricamente obrigados a servir o exército. Quer mais preconceito que isso?
  • Na maior parte do mundo, a maioria dos suicídios é de homens. Quantas políticas há para resolver o assunto?
  • Propagandas de Bom-Bril (produzidas por homens!) podem dizer que homem é ser não evoluído, que não presta, que é estúpido. Misandria pode; se fosse misoginia, duvido que passava incólume.

Enfim, dá pra ver que assunto não falta para se discutir num Dia do Homem. Para reforçar: a lista acima compara situações entre homens e mulheres, mas é para demonstrar o preconceito inerente nas diferenças de tratamento, não para culpá-las ou dizer que o preconceito vem delas. Ele vem dos homens também, muitas vezes com mais força.

Homens, ainda precisamos nos discutir muito. Se precisar fazer um dia pra isso, que seja.


Mais sobre bandeiras: SP e RJ

12/05/2011

O leitor Auriel fez um comentário interessante no primeiro post sobre a sugestão de bandeira para o estado de São Paulo. Bem interessante e achei que merecia ser respondido num post próprio. Diz o Auriel:

Curiosamente, a bandeira de navegação de São Paulo nos idos do império era branca com o campo central dividido em azul e vermelho… (dá uma olhada no site crw flags que você verá)

E a Arquidiocese de São Paulo tem como símbolo um escudo igualmente metade vermelho e metade azul… então creio que de fato essas cores já simbolizaram SP. Você já sabia disso ou foi um caso de mediunidade? :D

A bandeira de navegação eu já devo ter visto em visitas ao Flags of the World (é o mesmo site que o Auriel mencionou, o crw flags), com certeza, mas não lembrava dela. A página da bandeira paulista no FotW é esta aqui, a bandeira de navegação está bem no final. Aliás, o FotW é de longe o melhor site de bandeiras que existe; se você não achou uma bandeira lá, vai ser difícil achar em outro lugar. Quanto ao símbolo da arquidiocese, a mesma coisa: já tinha visto antes, mas nem me lembrava. Foi só coincidência, mesmo. Usei as cores aproveitando que já estavam na bandeira atual, e encaixavam nos significados propostos. Mas é interessante que se encaixem em algum tipo de sequência histórica.

Seria legal uma nova bandeira para o estado do Rio de Janeiro. A atual é medíocre e sem explicação. Fora que tem um brasão no meio, e nenhuma bandeira respeitável deveria ter brasão, brasão é uma coisa, bandeira é outra…

Com certeza! Brasões, mapas e textos (é, “ordem e progresso”, estou olhando pra você) não ficam bem em bandeiras. São muito complicados ou explícitos, e uma bandeira deve ser simples e simbólica. Às vezes até dá pra fazer uma ou outra coisa que fuja disso, claro, mas é difícil.

O grande problema da bandeira do Estado do Rio é que sua origem é obscura. Como a cidade do Rio foi separada na República como Distrito Federal, toda a história da formação da província ficou na bandeira da cidade: flechas de São Sebastião, esfera armilar, os golfinhos da baía… E a bandeira do Estado foi criada só com elementos do interior e uma inexplicável águia (o que águias tem a ver com o Rio? me parece um animal padrão para bandeiras, na dúvida colocam uma águia ou leão!).

Após a fusão Guanabara + Rio mantiveram a bandeira do estado desimportante e ignoraram completamente os elementos da Guanabara, o berço do estado!

Isso tudo vai para a lista de polêmicas envolvendo a fusão dos dois estados. Até hoje tem carioca contra essa junção. Um resumo para quem não conhece a história: Quando era a capital da república, o município do Rio de Janeiro era o Distrito Federal e não fazia parte do estado do Rio de Janeiro. Em 1960, com a capital movida para Brasília, o antigo Distrito Federal passou a ser o estado da Guanabara, ou seja era um estado com uma cidade só. Ele durou até 1975, quando os estados do Rio de Janeiro e da Guanabara se juntaram em um “novo” RJ.

Na prática, porém, foi mais uma anexação da Guanabara pelo Rio para eliminar a anomalia, e não uma junção para formar um novo estado. Além disso, a bandeira estadual do RJ já existia há muito tempo, a de Guanabara era só uma adaptação dos símbolos municipais, mais identificados com a cidade do que com o estado. Acho que tudo isso contou para se manter a bandeira do RJ, mesmo que ela não tenha sido feita levando a cidade em consideração.

Toda essa confusão à parte, pra mim tanto a bandeira do estado como a do município precisavam mudar por motivos de design vexilológico. Talvez seja um trabalho mais adequado para alguém mais conhecedor do estado, mas quem sabe um dia eu não faço uma tentativa ;)


Reforma política, Parte 1 – o “distritão”

28/04/2011

No final da série de posts sobre o sistema eleitoral brasileiro, que fiz no ano passado, disse que poderia voltar ao tema de política, falar de outros sistemas. E aí que o Congresso Nacional está discutindo a reforma política. É a ocasião ideal pra começar uma nova série!

A minha principal base para falar de sistemas eleitorais é o ótimo ACE Project, que tem dentro dele uma enciclopédia bem acessível sobre o tema. É em inglês, mas o site também tem versões em espanhol, francês e árabe, se alguém preferir ;) Na verdade, essa enciclopédia é uma versão de um livreto do International Institute for Democracy and Electoral Assistance (International IDEA). O livro tem licença Creative Commons e pode ser baixado de graça (ah, as maravilhas do não-copyright). Prefiro a versão enciclopédia do ACE porque às vezes aparecem comentários pertinentes que os autores deixam para complementar a informação (já falei das maravilhas do não-copyright?). Os termos serão traduzidos direto de lá, e podem não coincidir com os que são usados de costume em português. Preço pela facilidade da informação. A Wikipedia também é sempre útil ;)

O principal ponto de discussão na reforma eleitoral é a votação para a Câmara dos Deputados (que também poderia afetar as votações para Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores). Uma proposta que foi sugerida por alguns parlamentares, e bastante criticada, é a do “distritão”, então a escolhi como o ponto de partida desta série.

Os posts 5 e 6 da série “Eleições” mostram como funciona a eleição brasileira para a Câmara. Resumindo, é um sistema proporcional de lista aberta, com as unidades da federação (UFs) servindo de distritos eleitorais. O princípio básico de um sistema proporcional é representar a variedade de posições políticas e ideias que exitem no eleitorado.

Um outro tipo de sistema é o de maioria/pluralidade. Os dois tipos (proporcional e de maioria/pluralidade) englobam quase todos os sistemas eleitorais praticados hoje. Os de pluralidade elegem os candidatos mais votados. É o caso das nossas eleições para o executivo (presidente, governador, prefeito) e para o Senado. O chamado “voto distrital”, bastante defendido por alguns, também se encaixa aqui. Assim como o “distritão”.

A diferença do distritão para o sistema atual é o cálculo dos votos. Atualmente, os votos de cada partido/coligação são somados para definir o número de cadeiras a que eles têm direito, e aí os mais votados desses partidos/coligações ocupam essas cadeiras. No distritão, os candidatos mais votados levam. Ou seja, se um estado elege 15 deputados, os 15 mais votados são eleitos. Em termos técnicos, é um sistema de voto único não-transferível.

De pronto, o que mais chama a atenção é a simplicidade. De fato, fica muito mais fácil de calcular e, por isso, de explicar para o eleitorado, mas quais são as mudanças que esse sistema traz nos princípios e na prática? Nos princípios, como já visto, substitui um sistema proporcional para um de pluralidade. Ou seja, em vez de se preocupar em representar a sociedade como um todo, quem conseguir mais votos, leva, e se uma minoria não conseguir votos para eleger um deputado, dança. Eu sou da opinião de que democracia é o governo do povo, e não da maioria (como muita gente costuma dizer por aí). Então é sempre melhor buscar algo que represente toda a diversidade da população, sempre atrás do contraditório e do consenso; só assim a sociedade avança. Aí fica óbvia a minha opinião quanto ao distritão, ou o voto distrital, ou qualquer outro sistema de pluralidade para eleição de deputados: 100% contra.

Outra razão para ser contra, na prática: sistemas de pluralidade vão atrás do voto de todo mundo, e aí quem se elege é aquele mais dominante na política: homem, branco, meia-idade pra cima, etc. Num sistema proporcional, diferentes identidades coletivas podem votar em quem as represente em particular. Como o nosso sistema é de lista aberta, acaba que os eleitos também tendem a ser desse mesmo grupo, mas há bem mais espaço para outros. Na prática, os campeões de votos dificilmente deixam de se eleger.

Tanto é assim que fiz um exercício político :P Como seria se, na última eleição para a Câmara, esse sistema fosse adotado? Mas fica pro próximo, pra este post não ficar muito grande.


Nada pessoal, só não é a sua história

11/04/2011

Apesar de adorar video games, na verdade são poucos os que conseguem me envolver de verdade. O que é uma bosta, porque eles têm tudo para ser o meio mais imersivo possível. Mas sempre aparece um ou outro game que renova toda a sua esperança. Acabei de terminar don’t take it personally, babe, it just ain’t your story e fiquei tão empolgado que vim aqui postar.

don’t take it personally, babe, it just ain’t your story é uma visual novel (vn). As vn são games bem pouco interativos, na verdade. Tem uma história, e você toma algumas decisões em certos pontos, que influenciam o desenrolar e o final. As vn são mais conhecidas pelas versões hentai, em que as mudanças mais relevantes são quais e quantas meninas (ou meninos) você consegue pegar. Uma pena, porque dá pra contar muita história boa com vn. É um gênero quase que só japonês, muito ligado à cultura otaku. É o caso de don’t take it personally. Ouvi falar desse jogo no Rocket, Paper, Shotgun, e falavam bem. E se um site que não tem nada a ver com otaku falou tão bem, fui logo ver.

No jogo, você é um professor substituto recém-contratado que vai dar aula pelo resto do ano para uma turma colegial. Isso em 2027. As salas de aula são bastante computadorizadas e existe um sistema chamado Amie que é uma espécie de Facebook futurista. Acontece que, por política da escola, você tem acesso a todas as mensagens que os seus alunos mandam, mesmo as particulares. Supostamente para evitar bullying e coisas do tipo. O Amie também tem uma espécia de 4chan embutido, o 12channel, que aliás o jogo te força a checar de vez em quando.

Logo na primeira parte, você tem a oportunidade [spoilerzinho] de ficar com uma das alunas. Quando cheguei nesse ponto, desanimei. Parecia que ia ser só mais uma vn com histórias de pegar meninas, e aí parei de jogar. Depois, resolvi dar mais uma chance, afinal não seria um jogo tão bem falado se fosse só isso. Ótima decisão. Aliás, se alguém espera alguma coisa visualmente mais explícita, vai se decepcionar. Ao longo do jogo, você vai xeretando a vida em rede dos alunos e ajudando-os com seus problemas de adolescentes. Sim, o jogo é muito mais sobre eles. don’t take it personally, babe, it just ain’t your story.

O jogo é muito bem escrito, e só por isso já valeria a pena. O roteiro tem alguns pontos meio forçados, mas a escrita é ótima. É muito difícil fazer uma análise mais profunda sem dar spoilers feios, que podem estragar toda a experiência. Nada está lá por acaso. Ele tem um metalinguagem impressionante (e com certeza isso me ajudou a gostar, adoro metalinguagem). Te faz pensar na própria narrativa. E paralelamente ainda passa uma mensagem bem clara.

É um jogo bem pouco interativo. A maioria das decisões de fala que você pode tomar (que já são poucas) não influem muito na história. É como se o jogador não importasse muito (desculpa, don’t take it personally, babe, it just ain’t your story). Mas o fato de ser você quem faz tudo é muito importante. É você quem vai espionar, por vontade própria, as mensagens dos alunos. Você, jogador. A perversidade da personagem é a sua. Quando uma menina manda para a namorada algumas fotos mais picantes, elas estão protegindas por senha. Não tem como adivinhar essa senha, mas não se preocupe: a autora do jogo postou no próprio blog. Quer ver? Vai lá, mas a perversão é só sua. Você não é só um espectador que se identifica. Fazendo as ações da personagem se refletirem nas do jogador, as emoções também se refletem. A culpa da personagem é a sua culpa, as reponsabilidades também. Esse jogo quase me fez chorar. Não lembro de nenhum outro que tenha chegado perto. A influência do jogador é pouca, mas a imersão é grande.

don’t take it personally, babe, it just ain’t your story foi todo escrito e programado por Christine Love, uma escritora e designer de jogos indie. Levou um mês pra ser feito. Pode ser baixado de graça aqui. Não requer prática nem habilidade, então não tem deculpa pra não tentar ;)


One flag to rule them all

31/03/2011

Faz tempo que estou para postar isto. É uma proposta final, se é que dá pra chamar assim, para a bandeira estadual de SP. Veio da sugestão dada nos comentários e que é uma evolução natural dos outros designs.

As linhas diagonais ficaram mais dinâmicas. A estrela foi um pouco para cima, para não ficar apertada e distribuir melhor o espaço. Pra mim, com certeza é a melhor das propostas. De novo, o significado proposto: o campo azul representa o Atlântico; a faixa branca, o litoral; o campo vermelho, o interior; e a estrela, a capital. Mais detalhes no post abaixo.

Mas não é só isso! Ao adquirir a nova bandeira do estado de São Paulo, você leva para casa, sem nenhum custo adicional, essa belíssima bandeira da cidade de São Paulo, para uso nos meses de verão!

Dizem que as melhores bandeiras não precisam de explicação ;)

UPDATE! Seguindo a sugestão da Louise nos comentários abaixo, uma versão com tom de azul diferente. Gostei mais :)


Uma bandeira nova para São Paulo

31/01/2011

Sempre fui interessado em vexilologia, que é o estudo de bandeiras. É um interesse que vai e volta, e recentemente bateu de novo. Dito isso, tem uma bandeira que eu acho muito ruim: a do estado de São Paulo.

Primeiro, por que ela não foi feita para representar São Paulo, e sim o Brasil. No final do império, havia no movimento republicano algumas propostas de futuras bandeiras republicanas. Uma delas era a do jornalista paulista Júlio Ribeiro, que depois seria adotada como bandeira de São Paulo. Como em outras propostas da época, as cores principais eram branco, preto e vermelho, para dizer que o povo é formado da união de brancos, negros e índios. Aquela velha história que todo mundo já ouviu, e que tá mais pra mito de formação. As estrelas representavam o Cruzeiro do Sul. Enfim, ela só foi adotada para SP porque não foi escolhida para ser a bandeira nacional. Tanto é que, na lei paulista que define a bendeira, tem todo um malabarismo para tentar relacioná-la ao estado: “A bandeira de São Paulo significa que noite e dia (campo burelado de preto e branco) nosso povo está pronto para verter o seu sangue (cantão vermelho) em defesa do Brasil (círculo branco e silhueta geográfica) nos quatro pontos cardeais (estrelas de ouro).” Noite e dia? Sério que isso é o melhor que vocês conseguiram inventar? Quatro pontos cardeais? No fim, não há nada na bandeira que remeta especificamente a SP.

Mas não é só isso. Independente dos significados, acho essa bandeira muito feia. Toda a combinação de cores é sem graça (nisso ela representa bem a fama do paulistano) e fraca. O design é parecido demais com a bandeira dos EUA, mas com as cores do Império Alemão. E essas listras em preto e branco parecem uniforme de presidiário (insight da namorada =P). Tem elementos demais, incluindo um mapa, que é um elemento muito complexo: bandeiras são símbolos, aí elementos muito complexos e realistas tiram essa força simbólica. Além de dificultar na hora de desenhar ou mesmo fabricar.

Então, vendo alguns sites de propostas para bandeiras novas (em especial este aqui), me inspirei para um desafio: fazer uma bandeira nova para São Paulo. Os primeiros resultados estão abaixo. São variantes de uma mesma ideia básica. Outras propostas podem aparecer, dependendo da inspiração ;)

Algumas observações valem para todas as propostas. Os designs têm que ser simples, de modo que sejam fáceis de lembrar e refazer; têm que ser únicos, difíceis de confundir, o que também ajuda a guardar na memória. Como já disse, a simplicidade dos símbolos ajudam na sua força. As cores usadas estão todas presentes na bandeira atual, e os seus valores são os mesmos que constam no manual de identidade visual do governo (é um PDF). Preferi deixar igual porque não sou bom em mexer com cores, e a relação entre elas me pareceu boa.

Essa é a primeira proposta. O campo azul à direita representa o oceano Atlântico, que fica a leste do estado. Foi por ele que chegaram os colonizadores portugueses, os escravos africanos e, especificamente no litoral paulista, os imigrantes. O mar paulista também será importante para o futuro, com as enormes reservas de petróleo encontradas nos últimos anos. O campo vermelho representa a terra de São Paulo, fazendo referência à “terra roxa” tão atraente para os cafezais, iniciando o desenvolvimento paulista. A estrela dourada representa a riqueza e o desenvolvimento do estado. Também faz referência à bandeira nacional, em que cada estado é representado com uma estrela, e aí reforça o papel de São Paulo como parte de um todo maior.

Eu fiquei com medo de que a estrela amarela no campo vermelho deixasse a bandeira com uma cara comunista, mas acho que o azul quebrou essa impressão. Ou pelo menos espero.

A única diferença da segunda proposta é a inclinção entre os campos azul e vermelho. Ela simula um pouco melhor o formato da costa paulista, mas sem deixar de ser bastante simples. A separação inclinada também pode deixar o campo azul mais fácil de ver com a bandeira tremulando, e criar um efeito visual mais bacana ;)

A terceira proposta adiciona uma faixa branca entre as partes azul e vermelha. Como as cores são fortes, os outros desenhos podem parecer pesados. Eu tive essa impressão e o feedback da minha namorada reforçou. Tive a ideia de adicionar a faixa branca para representar o litoral. Aí dá pra fazer outra brincadeira com os significados e a tradicional divisão do estado em capital, interior e litoral. O azul continua sendo o Atlântico, o branco é o litoral (uma abstração para a areia), o vermelho representa o interior (a terra roxa e tal) e a estrela amarela representa a capital, centro da riqueza do estado. Como é uma estrela, as suas pontas significam também o desenvolvimento se espalhando pelo estado, se interiorizando, como acontece hoje. Tá certo que é aos trancos e barrancos (ou numa estrada decente pagando uma fortuna em pedágio, você escolhe), mas acontece. Espero que essa variante esteja mesmo mais leve, mas talvez precise de alguns retoques.

E aí? Vocês prefeririam uma dessas bandeiras? Aliás, por que não uma enquete?

Comentários, como sempre são muito apreciados ^^

PS: esqueci de dizer, mas todas essas propostas são copyleft. Qualquer um pode fazer o que quiser com elas e usar como quiser.


Resenha: Mafia II

07/09/2010

Nesses últimos dias estava com um jogo, o Mafia II. Acabei ele anteontem, e como não é lá muito comum eu conseguir jogar um jogo até o fim, resolvi colocar minhas impressões aqui. Não tenho acompanhando tão bem as notícias de games, mas parece que ele era bastante antecipado. A desenvolvedora é a 2K Czech (antiga Illusion Softworks, antes de ser comprada pela Take-Two Interactive em 2008 e colocada sob o comando da subsidiária 2K Games). Em 2002, a empresa fez Mafia: the city of Lost Heaven, que nunca joguei, e por isso não posso comentar sobre avanços do jogo atual em relação a ele.

Mafia II se passa na fictícia cidade americana de Empire Bay, uma mistura de várias cidades reais, como Nova York, San Francisco e Detroit. Você é Vito Scaletta, um imigrante italiano que é mandado para lutar na Segunda Guerra Mundial e, ao voltar, entra no mundo do crime organizado. A história acontece entre as décadas de 40 e 50, e o mundo reflete essa passagem. Os carros, as músicas e até os figurinos das personagens mudam. Esse é o ponto forte do jogo: a atmosfera. O visual é lindo, e de forma natural, sem querer o tempo todo chamar a atenção para mostrar como é detalhado. A dublagem é das melhores; os sotaques italianos ajudam a assentar a ambientação, sem parecer caricatos.

Durante o jogo, acompanhamos os altos e baixos de Vito em sua escalada pela “família”. Isso é outro ponto importante: geralmente a trajetória das personagens de games é bem linear, e ascendente. Seria de se esperar que começássemos como capangas baratos e terminássemos o jogo com um don, mas não é bem isso o que acontece. A narrativa tem suas reviravoltas, mas é bem amarrada, o que só aumenta a vontade de ver no que vai dar. Como sempre nos games, a contrapartida de uma narrativa bem fechada é uma falta de liberdade para seguir seu próprio caminho. Aí vai do gosto do freguês preferir um ou outro. Mas não dá pra negar que a história e a ótima ambientação do jogo deixam o jogador entretido e com vontade de continuar.

Ao jogar, não conseguia tirar da cabeça um outro jogo: Grand Theft Auto IV (ou só GTA IV). Não é de surpreender, afinal Mafia II é um jogo tipo sandbox, ou seja, ele te oferece um mundo para explorar, sem ficar preso às missões do jogo. E foi a série GTA quem popularizou e definiu o padrão nesse tipo de jogo. Além disso, a interface gráfica lembra muito o GTA IV. Faz sentido, já que a 2K Czech é agora parte da Take-Two, que também abriga a desenvolvedora do GTA. Imagino que os dois jogos tenham sido desenvolvidos com ferramentas semelhantes, o que explica a semelhança e, claro, não retira em nada o mérito da equipe de arte da 2K Czech.

Mas o que me fez ficar mesmo com o GTA IV na cabeça foi a história. Vito Scaletta e seu melhor amigo Joe Barbaro me lembraram muito a história dos primos Niko e Roman Bellic. Nos dois jogos você controla um imigrante, o italiano Vito em Mafia II e o sérvio Niko em GTA IV. Os dois chegam como veteranos de guerra (Segunda Guerra Mundial e Guerra da Bósnia, respectivamente). Vito já imigrara antes de ir para a guerra, mas volta depois de muito tempo, quase um recém-chegado outra vez. Ambos são recebidos por amigos (Joe e Roman) envolvidos com o submundo do crime, no qual convencem os protagonistas a entrar como parceiros. Até as personalidades têm semelhanças: Vito e Niko nunca ligaram muito para o cumprimento da lei, mas são bastante razoáveis e cautelosos antes de se meterem em algum esquema. São arrastados por seus companheiros, ambos impulsivos (e cafonas também). Pra mim, é uma confirmação da falácia da originalidade: ao contrário do que se diz, uma história não precisa ser original para ser boa. Claro que ninguém quer ver a mesma história repetida sempre e do mesmo jeito, mas mesmo obras muito semelhantes em aspectos básicos podem ser boas individualmente. Mafia II tem todas essas semelhanças com GTA IV, mas consegue fazer de sua ambientação uma grande diferença, e consegue que os detalhes diferentes transformem-se em rumos distintos para a história.

Dito isso, Mafia II parece não ter aprendido tanto quanto podia de outros jogos sandbox. A graça de um sandbox, como escrevi antes, é justamente poder interagir com o mundo independentemente da narrativa principal. O jogo parece não entender isso. Não há nenhum momento em que ele diz: agora você faz o que quiser e, quando achar que deve, continua a história. O tempo todo ele te diz o que fazer. Claro que você não precisa obedecer e pode explorar o mundo, mas o jogo não te incentiva. Mais que isso: não te dá alternativas interessantes. Você pode sair pela cidade a procura dos colecionáveis (ver mais abaixo) espalhados por aí, mas isso é para aqueles que fazem questão. Você pode entrar nas lojas e comprar roupas e armas, comer nos restaurantes, levar carros para o desmanche. Mas não encontra muita razão pra isso. Eu passei pelo jogo inteiro sem fazer nada disso, nenhuma vez, com exceção das lojas de roupas. E estas justamente porque o jogo te incentiva: ao ser procurado pela polícia, trocar o vestuário faz com que parem de te reconhecer. Poder fazer um monte de coisas só por fazer não adianta muito. Menos ainda quando o jogo está sempre te lembrando do próximo passo para avançar a história. É essencial num jogo desses ter momentos sem missão alguma a cumprir, e poder escolher entre várias coisas a se fazer (além de continuar com a missão principal). Oras, você é um capanga da máfia, com certeza não faltam superiores querendo seu trabalho. Em princípio, não há nada de errado em fechar a história. Acontece que Mafia II quer parecer mais que isso. Quer parecer um jogo aberto, com um mundo dinâmico influenciado por suas ações. Um mundo onde você pode esquecer a história principal e simplesmente viver nele. Não é o que acontece: o mundo serve como coadjuvante, para compor a atmosfera do jogo. E se você não pode viver o mundo, não tem sentido ou utilidade usar todas as opções que ele dá.

Citei os colecionáveis no parágrafo anterior. Eles vêm em dois tipos: cartazes de “procurado” espalhados pelas pareces da cidade, e revistas Playboy da época. Cada vez que você pega uma dessas revistas, aparece uma foto da playmate da edição. O jogo já seria proibido para menores de qualquer jeito, por causa da volência. Mas a ideia é interessante porque tem razão de ser: ajuda a ambientar o jogo na sua época e no universo da personagem principal, cheio de machões mal-encarados. O problema é que várias dessas revistas aparecem durante as missoes. É estranho estar no meio de um tiroteio, de repente avistar uma Playboy, pegá-la pra dar uma olhada, e depois voltar para o tiroteio. Interrompe o clima e a concentração. Talvez fosse melhor se as imagens não aparecessem quando se pega a revista e sim quando o jogador quisesse, indo ao menu do jogo. Além disso, a aparição repentina de mulheres seminuas na tela pode criar situações bem desconfortáveis para quem joga num video game ou computador na sala, ou outro lugar onde circulam pessoas.

Mafia II, no final das contas, é um jogo muito bom, se você considera o que ele te oferece de fato. Mas é difícil não se desapontar pelo tanto que ele indica oferecer. Fica aquela sensação de que falta alguma coisa. Recomendo para quem quer uma história muito bem contada e boas sessões de tiroteio. Mas se você gosta mais de um verdadeiro sandbox, de explorar todos os desafios que o mundo te oferece, não vai encontrar muita motivação para isso.


Eleições, parte 6 – Eleições proporcionais II

30/07/2010

Já sabemos que o primeiro passo é dividir as cadeiras entre os partidos/coligações. Dentre todos os métodos possíveis para isso, o sistema brasileiro não se contentou com um e usa dois! Como agora entraremos em abstrações matemáticas, vou acompanhar com um exemplo: as eleições de 2006 para a Câmara dos Deputados em São Paulo (como o voto para a câmara federal é distrital, é preciso fazer as fórmulas para cada estado). Para ajudar, é melhor deixar numa outra aba esta planilha que eu fiz com todos os números e passos.

O método que se usa primeiro é o quociente Hare, que a legislação chama de Quociente Eleitoral (QE). É simples: divide-se o número de votos válidos (ou seja, descartando os brancos e nulos) pelo número de cadeiras em disputa. São Paulo tem direito a 70 cadeiras na câmara; na eleição de 2006, de acordo com o TSE, foram 20.789.076 votos válidos para deputados federais no estado. Logo, o QE é 20.789.076 dividido por 70, o que dá 296.987. Isso quer dizer que SP tem, em média, 296.987 votos para cada cadeira. Calculado o QE, é preciso calcular o Quociente Partidário (QP): quantas vezes cada partido/coligação atingiu o número de votos para conquistar uma cadeira. Logo, é só dividir o número de votos de cada partido/coligação pelo QE. O resultado está na coluna D da planilha. Os números estão com 14 casas decimais porque é quanto o TSE considera para os cálculos. A soma de todos os QPs dá exatamente 70, o número de vagas. Acontece que são números fracionados, e não dá pra ocupar uma fração de vaga. Por isso, as frações são desconsideradas: aí o total de cadeiras preenchidas baixa para 62 (coluna E). Agora algo muito importante acontece: todos os partidos/coligações que não alcançaram pelo menos um QE são eliminados da disputa. Em nenhuma circunstância eles receberão alguma das 8 vagas que faltam. Como o quociente Hare foi feito para outro sistema de votação, ele não diz o que fazer com as vagas restantes.

Aí entra o segundo método, o método d’Hondt. Na verdade, ele poderia ser usado desde o começo; a função do quociente Hare é eliminar os grupos que não conseguiram alcançá-lo. Não fosse por isso, o método d’Hondt daria conta do recado. Explicar o método d’Hondt é um pouco mais complicado: divide-se os votos de cada partido/coligação pelo número de vagas que ele já consegui mais 1. Ou seja, se um partido já conseguiu 5 cadeiras, por exemplo, seus votos serão divididos por 6. Quem obtiver o maior resultado ganha uma vaga, e repete-se o esquema até acabarem as vagas. Assim, se o partido do exemplo obtivesse o maior resultado, levava a vaga, mas teria que dividir seus votos por 7 para a próxima disputa, porque estaria com uma cadeira a mais. A ideia por trás é perguntar qual partido teria a maior média por vaga conquistada se levasse a próxima vaga, por isso se soma 1 ao número de vagas já ganhas. Por isso, o método d’Hondt se encaixa na categoria de “métodos das médias mais altas”. Ter a maior média de votos por vaga é o princípio que norteia todos os cálculos desse método. Na planilha, cada vaga restante é uma coluna (F a M), e o partido/coligação com a maior média está assinalado em verde.

Qual a proporcionalidade entre votos e cadeiras conseguidas para cada partido? Como só há um voto por eleitor (poderia ser um sistema de preferências ou de notas, por exemplo), é fácil calcular (o primeiro número é a porcentagem de votos válidos recebidos, o segundo é a porcentagem de vagas conquistadas):

PSDB/PFL 29,21% 32,86%
PT/PC do B 19,86% 21,43%
PP 7,56% 7,14%
PV 7,12% 7,14%
PSB 5,94% 5,71%
PTB 5,20% 5,71%
PDT 5,03% 4,29%
PMDB 3,81% 4,29%
PL 3,21% 2,86%
PPS 2,92% 2,86%
PTC 2,54% 1,43%
PSC 2,29% 1,43%
PRONA 2,10% 1,43%
PSOL/PSTU/PCB 1,56% 1,43%
PSL/PHS 0,51% 0,00%
PSDC 0,40% 0,00%
PRP/PT do B/PTN 0,38% 0,00%
PMN 0,13% 0,00%
PAN 0,12% 0,00%
PRTB 0,06% 0,00%
PCO 0,03% 0,00%

Depois posso falar de outros métodos de votação e fórmulas, e comparar as proporcionalidades.

Bom, dividimos as cadeiras, agora temos que decidir quem as ocupa. É a parte fácil: como dito no post anterior, cada partido que conseguiu vagas as preenche na ordem dos mais votados. O TSE divide os eleitos entre “eleitos” (os que foram eleitos pelo quociente Hare) e “eleitos por média” (os que foram eleitos só depois que se aplicou o método d’Hondt). Por exemplo, se um partido conseguiu 5 cadeiras pelo Hare e depois mais 2 pelo d’Hondt, os 7 candidatos mais votados desse partido estão eleitos. Os 5 primeiros são “eleitos” e os outros 2 são “eleitos por média”. Não sei se existe alguma razão para o TSE diferenciar, a não ser pela estatística. Para todos os fins práticos, são todos igualmente deputados eleitos.

Definidos os eleitos, o último passo é definir os suplentes. Ao contrário dos candidatos ao executivo, que têm vices, e dos senadores, que já fazem chapas com suplentes, os outros cargos não têm suplentes pré-definidos. Cada partido/coligação tem tantos suplentes quanto foram os eleitos; eles são os próximos da lista por ordem de mais votados. No exemplo do partido com 7 vagas, os 7 candidatos mais votados ocupam as vagas e os próximos 7 são os suplentes. Simples.

E aqui acaba a série para descrever como funcionam as eleições no Brasil. Espero ter ajudado! Próximo passo: analisar como poderiam ser as eleições no Brasil ;D Mas, por enquanto, um merecido descanso, para mim e para vocês.

PT/PC do B

Eleições, parte 5 – Eleições proporcionais I

30/07/2010

(Como esse post ficaria enorme, vai ser dividido em dois)

Finalmente chegamos à parte mais obscura das eleições: as proporcionais. São bem raras as pessoas que sabem exatamente como se escolhem os Legislativos pelo país. O Senado foi explicado no texto anterior e é o mais fácil de entender: vota-se em uma ou duas vagas e quem tiver mais voto leva. Já as outras instâncias legislativas – Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas e Câmaras dos Vereadores – são eleitas por representação proporcional. Isso significa que eles devem representar as várias opções políticas que compõem a sociedade.

Existem vários métodos de votação para a representação proporcional, porque nenhum deles é perfeito para todos os critérios. Logo, para escolher um deles é preciso escolher que critérios usar. Não sei quais foram os critérios que guiaram a escolha do sistema brasileiro, e não duvidaria que não existam (critérios claros são raros na política brasileira). Consigo imaginar alguns, mas é chute. Simplicidade para o eleitor parece ser um: vote na pessoa que achar melhor, e pronto. Mas os sistemas nunca são tão simples, e no fim das contas ninguém sabe como, de fato, o voto ajuda um candidato a ser eleito. Entre todas as campanhas de conscientização do TSE, nunca há nenhuma que explique como funciona a votação. Ou seja, simplificar para o eleitor pode ser, na verdade, tratá-lo como incompetente, que não conseguiria fazer nada mais complexo. Foi o meu desconhecimento com os detalhes da votação proporcional brasileira que me motivaram a escrever esta série.

Falo tudo isso por uma razão: pouca gente sabe que o voto, nas eleições proporcionais, são dois votos em um, no sentido em que eles servem para escolher duas coisas. A primeira é quantas cadeiras vão para cada partido. A segunda é quais candidatos dentro do partido vão ocupar as cadeiras. Aí vem a situação bastante comum no Brasil, que é votar na pessoa, sem se importar tanto com o partido. Mas antes de ajudar aquela pessoa a ganhar, o eleitor ajuda o partido pelo qual ela se candidata. As vagas se distribuem entre os partidos mais votados, não entre os candidatos. É por aí que se explica os partidos irem atrás de tanta gente famosa para se candidatar, não interessa se a pessoa tem alguma noção de política ou não. Se o candidato famoso ganha ou não faz pouca diferença, contanto que infle a contagem partidária. Reparem que os famosos que caem de paraquedas na política sempre são convidados pelos partidos, nunca aparecem por iniciativa própria. Provavelmente muitos deles podem achar que estão ali seriamente, convencidos por alguém do partido de que são importantes para alguma causa, quando na verdade são usados só para chamar votos. Mesmo assim, é bom lembrar que existem pessoas famosas que não caíram de paraquedas e têm projetos sérios, mesmo que sejam uma minoria. E o eleitor, achando que ajuda um ídolo a ser eleito, na verdade ajuda um partido com o qual ele (o eleitor) pode não ter conexão nenhuma. Só um exemplo de como não conhecer o funcionamento do sistema pode enganar o eleitor e até o candidato.

Há uma diferença entre a eleição para a Câmara dos Deputados e as eleições para os legislativos estaduais e municipais. A eleição para a câmara federal é distrital. Os distritos, no caso, são os estados e o Distrito Federal. Cada um deles tem um número pré-definido de deputados, e as candidaturas só valem para aquele estado onde acontecem (o eleitor de um estado tem não pode votar num candidato de outro). Já as eleições para os outros legislativos são para todo o território que ele abrange (um estado ou um município), sem divisão em distritos.

É importante entender alguns conceitos. As eleições proporcionais no Brasil são para múltiplos vencedores, de lista aberta e, no caso da câmara federal, distrital (explicado acima). Os múltiplos vencedores são autoexplicativos (vários cargos em disputa), e a lista aberta significa que cada partido oferece uma lista de candidatos e o eleitor escolhe em qual deles votar, permitindo ordenar os candidatos pela votação. Numa lista fechada, os partidos dão a lista com os candidatos numa ordem determinada, e o eleitor vota somente no partido. Outra coisa importante é que os partidos podem se coligar. Não tem relação direta com as coligações para o Executivo; nas coligações proporcionais, partidos coligados contam como se fossem um partido só.

(continua… ou, para quem lembra de alguns animes de um tempo atrás, つづく)


Eleições, parte 4 – Eleições majoritárias

27/07/2010

Não, eu ainda não desisti da série. Dei uma sumida, mas voltei. Como disse no último post, é hora de falar nas eleições majoritárias. Assim começa o objetivo principal dessa série: entender o processo de cada eleição, em especial como os votos são calculados.

As eleições majoritárias no Brasil costumam ser para cargos do Poder Executivo: presidente, governadores e prefeitos (e respectivos vices). Mas um órgão legislativo também é eleito por esse processo: o Senado.

Nos cargos executivos, os candidatos podem representar um partido ou uma coalizão de partidos. As maiores candidaturas geralmente são de coalizão. Há várias razões para isso, mas talvez a principal, no caso do Brasil, seja o horário eleitoral em rádios e TVs. Cada partido tem um determinado tempo no horário eleitoral, dependendo da sua representação na Câmara dos Deputados: quanto maior a bancada, maior a fatia do horário eleitoral. Para as coalizões, o tempo de propaganda é a soma dos tempos de cada partido coligado. Ou seja, quanto maior a coalizão, maior o tempo eleitoral. E como no Brasil se sabe que o horário eleitoral é um dos principais fatores para se ganhar uma eleição, as candidaturas costumam procurar o apoio do maior número possível de partidos.

Pelo sistema de voto majoritário adotado, um candidato ao Executivo precisa de maioria absoluta (mais da metade) dos votos válidos para ganhar. Votos válidos são todos os votos menos os brancos e nulos. Se nenhum candidato tiver a maioria absoluta, acontece um segundo turno com os dois mais votados, no qual o vencedor terá obrigatoriamente mais da metade dos votos válidos. No caso quase impossível de a votação empatar, a Constituição costuma dar vantagem ao candidato mais idoso. Uma exceção na regra da maioria absoluta são as eleições municipais: o candidato só precisa de uma maioria relativa (também chamada de pluralidade) para ganhar, ou seja, o mais votado no primeiro turno ganha. Apenas os municípios com mais de 200 mil eleitores precisam de maioria absoluta (e dois turnos, se necessário).

As eleições para o Senado são um pouco mais complexas. Cada Unidade da Federação (UF), que são os estados e o Distrito Federal, tem 3 senadores. O mandato de senador é de 8 anos, enquanto o de todos os outros cargos eleitos é de 4. Apenas uma parte do senado é renovada a cada eleição: alternadamente, 1 ou 2 das 3 vagas. Ou seja, numa eleição um terço do Senado é renovado e na próxima são os outros dois terços. Neste ano, são duas vagas renovadas por UF. No caso das eleições com uma vaga, o processo é igual ao das eleições municipais: o candidato com mais votos ganha, sem precisar de maioria absoluta. Quando são duas vagas, cada eleitor tem dois votos, de peso igual. Os dois candidatos mais votados são eleitos. Aqui pode haver alguma confusão: os votos para as duas vagas vão para a mesma ocntagem. ou seja, não há distinção entre o primeiro e o segundo votos.

Os candidatos a senadores não tâm vice, e sim dois suplentes. As candidaturas ao Senado dependem das situações dos partidos em cada UF. Ou seja, não depende das coligações nacionais, e sim das estaduais. Isso é importante porque cada coligação, ou partido não-coligado, só pode ter um candidato por vaga. Isso cria uma das várias esquisitices do sistema político brasileiro: o senador atua no âmbito federal, enquanto a coligação estadual é pensada mais para eleger os governos estaduais do que os senadores. Um exemplo de problema causado por isso aconteceu no Rio de Janeiro este ano. No plano federal, o PV lançou Marina Silva para presidente sem coligação. Mas no RJ lançou Fernando Gabeira numa coligação com PSDB, DEM e PPS, que resolveu lançar candidatos do DEM e PPS para o Senado. O PV gostaria de lançar uma candidatura ao Senado também, afinal poderia ter um apoio num eventual governo da Marina. Mas não pôde, e tem que apoiar a candidatura de dois senadores que na verdade apoiariam um eventual governo de Serra. Talvez numa nova série sobre reformas políticas eu trate mais dessas esquizofrenias.

No próximo capítulo, as eleições proporcionais: preparem as calculadoras!